Grace Silva, que tem mexido com a cena gay de BH, desnuda-se!

A balada que foi bem e a que passou longe disso, está tudo no perfil da personagem no Facebook, que coleciona tanto inimigos quanto fãs

Publicado em 22/10/2015
Grace Silva, a personagem do Facebook que fala da noite de Belo Horizonte
A cantora Grace Jones inspirou o nome da personagem

Por Raphael Rocha

Badalada, bafônica, sincera! Grace Silva nasceu há cinco meses e já virou assuntos nas rodas e redes sociais dos belo-horizontinos. O perfil no Facebook é o alter ego de uma pessoa que está na noite há duas décadas e cansou da ineficiência de alguns clubes, produtores e drag queens. 

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Na internet, Grace divulga as festas que prometem no fim de semana. Na segunda-feira, ela conta tudo o que deu certo e o que não foi bem. E o pandemônio começa! 

Em um fim de tarde, no Edifício Maleta, conversamos com essa persona que não merece, de forma alguma, a pecha de ser negativa, destrutiva. Pelo contrário, como se vê abaixo, para ela não é só os holofotes que devem brihar, mas a auto-estima de quem faz e curte baladas em BH também! Montemos nesse unicórnio reluzente de Grace Silva! 

A Grace nasceu de um dark room, de um globo de espelho ou de uma fila de duas horas para entrar na balada?
Em uma fila de duas horas esperando uma balada. Eu detesto passar por isso e é disso que eu reclamo.

E esse nome? O quê da divina Grace Jones você tem? 
Na verdade meu nome foi escolhido porque ela é uma diva das baladas. A Grace Jones, oficial, cantora, é uma das primeiras que eu conheço que fazia performances, aberturas de noites. Têm fotos dela, na internet, com a Divine, que era uma drag famosa do cinema. E ela fazia as aberturas do Studio 54, ela entrava de moto, a cavalo. Ela fazia essas grandes aberturas que hoje a gente tem, tipo na The Week e outras festas grandes. 

Qual a missão da senhora?
Defender o cliente, o público. Hoje eu defendo bastante o público, tipo: o que as pessoas gostam, se elas são bem atendidas, se o lugar está receptível, foi preparado e principalmente onde não foi bem preparado (risos).

A noite é perigosa já para quem se comporta. Imagine para quem dá navalhadas em casas noturnas e produtores. Criar uma personagem foi necessário para evitar você ser rejeitada?
Não, a ideia da criação da personagem não tem a ver com isso. Não tenho medo nenhum da rejeição dos produtores e artistas. Até porque eu trabalho e conheço vários deles, inclusive já critiquei pessoalmente no Facebook deles. A criação da personagem veio para fazer uma brincadeira, o mesmo que acontece no programa RuPaul's Drag Race, ou seja, criticar a artista do palco. Mas quando eu comecei a fazer isso pelo Facebook, claro, elas não gostaram, e virou uma grande fofoca. Elas espalharam o meu nome e a coisa ficou muito grande rapidamente.

Minha personagem só tem cinco meses e já no primeiro mês eu tinha mais de mil amigos, por causa do rebuliço que deu, pois eu comecei a dar notas para elas e elas não admitiam isso. Mas pensa, eu sou cliente, estou pagando a entrada da balada e essa entrada inclui o show. É dali que eles tiram o cachê do artista, então eu posso dizer se eu gostei ou não. Existe um grande atrevimento delas (as drags) de exigir que você aplauda depois do show, mesmo que tenha sido ruim e muitas fazem isso. Elas sobem no palco e gritam: "pode aplaudir!".

O aplauso é um direito que o público tem de dizer se gostou ou não, quer dizer, ela faz um show ruim e eu sou obrigada a dizer que gostei? Não! Então a brincadeira era essa. Só que quando eu comecei a escrever sobre os artistas, quem lia também pedia para que eu falasse sobre as casas. Percebi que o trabalho dos artistas estavam ligados à casa onde eles trabalhavam, então eu pensei: "Realmente, as casas não estão bem não". Foi quando eu comecei a falar das casas e das festas.

E está disposta a revelar sua verdadeira identidade?
Não (risos). Vou manter o mistério mesmo que as pessoas tenham dúvidas.

As phynas. As do povo. Com quem Grace gosta de andar e se divertir?
Em todas. Eu vou em tudo. Se tiver que ir na Gaymada, na Praça da Estação, eu vou. Se tiver que ir na balada mais fina das descamisadas e fazer carão eu também faço. Frequento tudo (risos).

Cite três coisas fundamentais que uma festa precisa ter para lhe agradar. 
Nossa (risos)! Vamos lá, o som deve ser de boa qualidade, mesmo! Não pode rachar, não pode faltar o grave, não pode ter excesso de agudo. Tem que estar bem equalizado porque é insuportável ficar em um cubo fechado com um som que dói os ouvidos. Então o som deve ser de muito boa qualidade. A casa não precisa ser bonita, mas deve atender à proposta que foi dada.

Então, se a proposta é uma festa alternativa no Mercado das Borboletas, que tenha cara de alternativo. Se for uma proposta de fazer uma coisa sofisticada, com cara de "zona sul", que seja com cara de zona sul. O que incomoda é você chegar na zona sul e ela estar com cara de Mercado das Borboletas, despencando e descascando. É isso que não dá!

A terceira coisa que é indispensável é a simpatia do dono da casa. O dono da balada tem que ser simpático com o cliente, ele deve descer do camarote, circular junto do cliente, dar boa noite e atender bem, brincar e dançar. Tanto que na "Missa da Pedro II" (Mineiro Bill), o dono dança no palco com os clientes e recebe bem todo mundo. Agora, aquele dono que fica no canto, fazendo pose no camarote... Esse daí está simplesmente usando o público para ganhar seu dinheiro. Isso já se encaixa no que é fatal para mim. Outras coisas a gente alfineta, mas perdoa (risos).

Quais os erros de gestão mais comuns que você vê nas casas e festas de BH? E os acertos?
Economizar para não perder lucro. Normalmente eles deixam, por exemplo, '"Ah, eu vendi tantos ingressos e não vou fazer a fachada da festa porque não vendi o suficiente pra isso", mas o cara que comprou o ingresso imaginou que teria uma fachada, um tapete vermelho luminoso. Esse lance de festa temática, por exemplo, você chega lá e não tem o tema porque ele não vendeu muitos ingressos e ele acha que precisa ter o lucro dele e não investe na festa. Eu imagino que deveria ser o contrário. Ele propôs uma festa, então se ele não lucrou com isso é porque divulgou mal, ele não investiu em formação do público, que é uma coisa que eles não estão investindo e vem sempre massacrando o mesmo público frequentador, nunca trazendo um novo.

Eles (produtores e casas) têm acertado muito na escolha dos DJs daqui, estão trazendo bons DJs de fora, mas os daqui estão sendo reconhecidos. Antigamente era muita panelinha e agora não. Se você não for um bom DJ e tocar bem a noite inteira, você não fica na casa. O que eu não vejo acontecer com as drags. Elas vivem em uma panelinha e não há uma drag boa no palco. Foi daí que eu comecei a questionar. Porque que está a mesma drag há 20 anos e cada vez o trabalho dela está pior, né? Eles não analisam se a drag já ficou ultrapassada ou se ela se renovou.

A Nayla [Brizard] é uma que me surpreende por não se acomodar, sempre faz uma coisa nova. Pensa, tem drag que está começando agora e está dublando música de 10 anos atrás, que é o estilo bate-cabelo e não sabe se renovar! Além disso, o pessoal mais alternativo tem feito muita coisa legal no Mercado das Borboletas. Estão investindo em celebridades, que, querendo ou não, trazem novidade pra BH. Quando você traz uma drag do RuPaul's Drag Race, você a vê ao vivo, repara como é a peruca, a maquiagem e como ela se comporta no palco. Está na hora do artista daqui perceber o quando ele está ultrapassado e deveria ter melhorado!

Que recado você tem para os gays de BH que acham que festas boas só são as feitas no eixo Rio-São Paulo?
Paciência! Porque eu acho que as coisas estão mudando. Têm produtor investindo para trazer o circuito pra cá. Tem a festa Supremacy, a White Emotion, então tem gente entrando na área trazendo esse circuito de artistas da cena eletrônica pra cá. Só tem que ter paciência. Acho que Brasília não é tão a nova rota para estes eventos, apenas têm investidores. Mas falta o mineiro acreditar nele mesmo.

BH é uma das três cidades do Brasil com mais locais e festas gays. Acha que os LGBT, as casas e os produtores daqui possuem noção do quanto BH tem potencial para ser uma cidade de grande atração dos turistas arco-íris?
Não, não sabem! Não é vendida essa imagem pra gente. O mineiro está aqui, e é vendido para ele que as baladas do Rio são melhores, que São Paulo é melhor e que Brasília é a nova rota, não Belo Horizonte. Eu brincando de dar apelidos e falando com as pessoas sobre o que aconteceu com elas durante a semana mantenho vivo o que ocorreu com elas no final de semana.

Muitas, durante a semana, têm um emprego simples, uma vida normal e tranquila, mas, na noite, elas são alguém e eu mantenho isso vivo na memória delas. Dessa forma, eles estão se valorizando porque eles saem na Grace. Eu mando um beijo pra um, um beijo pro outro, falo que os vi na balada e eles estão começando a reconhecer seu valor. 

Trabalhamos em sete capitais, e a noite de BH têm características próprias bem interessantes. Exemplo: a mistura de lésbicas com gays, boates tocarem música ao vivo, o quanto se ama uma calçada, e o ecletismo do som que o público daqui gosta. Concorda essa visão? O que acha dessas particularidades?
Eu acho ótimo! O diferencial nas festas daqui é realmente a mistura de gays e lésbicas na mesma balada. A gente já teve isso no The L, temos agora no Fifty, que toca música ao vivo, e é uma coisa que a gente só encontra aqui. Quando você vai pro eixo Rio-São Paulo, a balada mais sofisticada, que não é pro pessoal se jogar tanto, normalmente só vai ter música mecânica e não vai ter música ao vivo. Isso é bem típico de Minas.

Todo mundo que vem aqui acha curiosa essa característica e gosta de frequentar. Tenho amigos de São Paulo que vêm pra BH só pra isso. O Villa Paraty, por exemplo, já existe há anos e ninguém tira o público deles. Ele não se abala com nada e o modelo dele é esse. É uma balada/barzinho que tem música ao vivo, onde gays e lésbicas se misturam. Nem eu nem outros produtores, ninguém mexe com ele. Nem com o Mineiro Bill. Pode abrir uma nova casa, com um novo produtor e essas casas não se abalam. Porque elas já criaram um modelo que agrada o público e tem um público fixo pra isso.


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